A Escola Agrícola de Lavras (EAL) tinha como finalidade proporcionar um curso especial de estudos para preparar os alunos que “se destinavam à vida de agricultores, e aproveitar a riqueza natural da terra”. Para possibilitar esse curso, , em 1907, o jovem Benjamin Harris Hunnicutt, com apenas 20 anos, recém-formado em Ciências Agrícolas pelo Mississipi State College, veio para Lavras. Na sua carreira, muitos feitos, incluindo ser o primeiro diretor da Escola Agrícola de Lavras.
Uma das paixões de Hunnicutt foi a cultura do milho, inclusive ele organizou exposições e publicou vários textos e livros com esse tema. Por volta de 1916, seria construído o primeiro silo aéreo, para ensilagem de milho, que existe até hoje dentro do recinto do Instituto Presbiteriano Gammon.
No início do século XX, o milho era denominado de “cereal de ouro” ou “trigo brasileiro” e já tinha sua importância na balança econômica nacional. Mundialmente, naquela época, ocupava o 3º lugar em importância em relação a outras culturas. Os EUA, origem desta espécie, produziam cerca de 75% da safra mundial (Ribeiro, 1922). Já em 1912, quando foram comercializados o equivalente a 1,5 bilhão de dólares, o milho foi considerado como rei naquele país – Corn is King (Ribeiro, 1922).
O Brasil, em 1916, ocupava o 2º lugar entre os países produtores de milho, e , já naquela época, raro era o município que não cultivava milho, tanto que os agricultores consideravam um “ano de prosperidade”, devido à alta produção , e os “paiois ficavam abarrotados”. Considerado o gênero alimentício mais consumido mundialmente, destinava-se à alimentação humana e animal, e, para esse último grupo, na forma de silagem ou diretamente para aqueles criados presos.
No início do livro “O Milho”, Hunnicutt publicou um mapa produzido de acordo com o censo de 1920, no qual é apresentada a distribuição da produção de milho no Brasil, concentrada nos estados do Sudeste e Sul (Hunnicutt, 1924).

Para a alimentação humana, haviam inúmeros pratos preparados com este cereal. Fato enfatizado durante a 4ª Exposição Nacional de Milho, quando foram apresentados 90 diferentes pratos preparados com milho, incluindo aqueles corriqueiramente utilizados pela população como “a cangica, migáo, cangiquinha, pipoca, paçoca, angú, pamonha, farinha de milho” (grafia da época).
Do milho nada se perdia. A palha (cana, folhas e espátulas) era utilizada como forragem, quando verde para ensilagem. Sabugo: combustível, se moído utilizado para alimentação do gado. Flores: funções medicinais. Cana: grande quantidade de sacarina e podia extrair o açúcar. Grãos: extração de álcool (com a ressalva de que seria mais prejudicial à saúde do que o de cana-de-açúcar). Grão fermentado: fabricação de cerveja. Grão torrado e moído: preparar um “café” para pessoas que evitavam a cafeína. Grão: alimentação humana (‘farinha de pão”, da fécula finíssima, a maisena – indicada para “manjares delicados” e para o estômago dos enfermos e crianças) e animal (Ribeiro, 1922).
Naquela época, porém, o produtor recebia pouco pelo produto, pois não conseguia vender para outras partes do país pela indisponibilidade de estrada de ferro e pelas tarifas cobradas, o que inviabilizava o transporte (Ribeiro, 1922). Em função disso, era mais barato, por exemplo, ao estado do Rio de Janeiro comprar milho de outros países do que de Minas Gerais, o que indicava que a agricultura ainda estava atrasada pela falta de uma estrutura de transporte (Ribeiro, 1922). A partir de 1916, o Brasil se tornou exportador de milho ((Hunnicutt, 1924).
Em 1922, a Escola Agrícola de Lavras criou o “Trabalho Experimental” com o objetivo de proporcionar experiência prática aos alunos. A proposta era realizar o trabalho em canteiros, reproduzindo as condições do campo de cultivo. Essa atividade abrangia todas as áreas da Agricultura e deveria contemplar o aprimoramento do cultivo e produção, o melhoramento das culturas e produção de novas variedades e a introdução de novas culturas e práticas de cultivo, incluindo fertilizantes. Tudo isso foi inspirado nas atividades já desenvolvidas na Estação Experimental de Iowa, EUA, maior estado agrícola americano.
Assim, considerando as culturas, para o milho, estavam previstos os seguintes ensaios: A) Variedades; B) Cultivo; C) Hibridação para produção. Também seriam realizados estudos de sistema de rotação e administração (o que deveria ser equivalente à condução da cultura atualmente) e de prática de fertilidade (O Agricultor, 1922).

Publicações

Conforme apresentado pelo próprio Hunnicutt, a publicação de 1924 foi uma ampliação de uma publicação menor - O Livro do Milho de 1916, que havia esgotado rapidamente (Hunnicutt, 1924). A proposta era apresentar aos produtores um texto útil e de fácil compreensão, servindo como “guia no desenvolvimento da lavoura de milho, que sempre haveria de ser o “Rei dos Cereaes do Brazil” (Hunnicutt, 1924).
O livro, organizado em 12 capítulos, explora diversos aspectos da cultura, iniciando com a Produção e distribuição mundial, Origem e descrição botânica, Melhoramento, Clima, Solos, Manejo da cultura, Colheita e Conservação, Pragas, Comercialização, Usos na alimentação animal e humana (incluindo diversas receitas), Silos e Ensilagem e as Exposições e Clubes de Milho. A obra é ricamente ilustrada com fotos e desenhos, muitos do próprio autor, alguns cedidos por empresas e outros colaboradores, e contém, por exemplo, muitas ilustrações dos equipamentos utilizados na cultura, como arados, grades, dentre outros, os quais foram cedidos pelos fabricantes dessas máquinas.
O livro foi dedicado em homenagem ao Exmo. Dr. Miguel Calmon du Pin e Almeida pelo seu “grande interesse que tem dedicado ao desenvolvimento da cultura do milho, muito assim concorrendo para o progresso econômico do paiz” (Hunnicutt, 1924). Miguel Calmon foi Ministro da Fazenda (1827, 1837 e 1842) e dos Negócios Estrangeiros (1829, 1862) no Brasil.
Nesse mesmo ano, foram também publicados livretos (Números 1 ao 5) explicativos de temas relacionados à produção e ao processamento do milho:
Em outra publicação de 1945, Brazil Looks Forward, Hunnicutt exalta a agricultura nacional e faz previsões positivas para o futuro. Nesta época, o Brasil já ocupava a 3ª colocação em produção mundial de milho, atrás dos EUA e da Argentina. A previsão, porém, era de que em breve passaria a ocupar a 2ª posição em função da expansão da área plantada, melhores métodos de cultivo, aumento da demanda pela indústria animal e a possibilidade de obtenção de melhores sementes. Já havia em desenvolvimento um programa de melhoramento na Estação Experimental do Estado de São Paulo/Instituto Agrícola de São Paulo, Campinas-SP (Dr. Arnaldo Krug, que recebeu treinamento na Cornell University) e outro na Escola Agrícola de Viçosa-MG (Dr. Antonio Secundino de São José Araujo, especializado em hibridação de milho em Iowa State College) (Hunnicutt, 1945; Hunnicutt, 1949).
As exposições
A realização de exposições foi uma iniciativa do Dr. B. Hunnicutt por entender que por meio desses eventos era possível estimular os agricultores a melhorar as suas produções. No discurso de abertura da 4a Exposição, ele apresentou este histórico da origem no Brasil (reprodução com graphia da época):
“Meus senhores.
Ao inaugurar a IV Exposição do Milho vou dar a história desta festa nacional do cereal de Ouro.
Tendo feito uma viagem aos Estados Unidos do Norte no anno de 1912, enviei ao Conde Amadeu A. Barbiellini proprietário da revista “Chácaras e Quintaes”, algumas photographias das Exposições de Milho naquelle paiz, e no mesmo anno assisti à Exposição Nacional do Milho, que se realizou em Columbia, no Estado de Carolina do Sul.
Voltei no anno seguinte ao Brasil, tendo escripto alguma cousa a respeito desta Exposição e da selecção do milho.
Em Novembro de 1914, poucos mezes depois da actual conflagração, recebi uma carta do Conde Barbiellini, convidando-me para dirigir uma Exposição de Milho, que a sua revista organizaria, no anno seguinte, em S. Paulo.
Depois da propaganda pela revista e a organização do regulamento, realizou-se, na séde da Sociedade Paulista de Agricultura, a 1ª Exposição Nacional do Milho, em Julho de 1915.
…..”
Continua….
E assim, as primeiras exposições foram realizadas:
1ª Exposição Nacional do Milho, São Paulo, 1915.
2ª Exposição Nacional do Milho, Belo Horizonte em 1916.
3ª Exposição Nacional do Milho, Curitiba, 1917.
4ª Exposição Nacional do Milho, Rio de Janeiro, 1918.
5ª Exposição Nacional do Milho, Lavras, 1926.
Sobre a realização da Exposição Nacional do Milho, Dr. Hunnicutt dizia:
"Milhares de pessoas visitam a feira todos os anos, e toda a comunidade é alcançada de alguma forma. Não só são apresentados produtos agrícolas, mas também exposições escolares e o trabalho doméstico das mulheres, para que toda a família encontre algo do seu interesse. Cada centro de missão agrícola pode ter uma feira anual, não importa o quão pequena seja a comunidade, e em muitos casos, um Estado inteiro pode estar interessado. Qualquer pessoa familiarizada com o progresso agrícola dos Estados Unidos e da Europa sabe que papel vital as feiras têm nesse desenvolvimento".

http://www.siaapm.cultura.mg.gov.br/acervo/fotografico/TG-104/69.jpg
Nas exposições de Milho, os produtores levavam lotes de milho e esses eram julgados por juízes, de acordo com regulamento e critérios estabelecidos. Havia quatro classes de milho: A: milho branco, grãos cheios e duros; B: milho branco, grãos dentados; C: milho amarelo, grãos cheios e duros; D: milho amarelo, grãos dentados. Ainda era escolhida a espiga campeã de toda a exposição e recebia o título de Champion do Brasil. Dentre os critérios que eram elencados em uma tabela, estavam conformidade e forma da espiga, base, pontas, circunferência, espaço entre fileiras, dentre diversos outros (Hunnicutt, 1924).
Em 1925, a Revista Chácaras e Quintaes promoveu a Semana do Milho, a qual teve como diretor técnico o Dr. Benjamim Hunnicutt.
Atualmente, o Brasil continua ocupando posição de destaque na produção e exportação mundial de milho, além de possuir grande importância na alimentação humana e animal. O pioneirismo da Escola Agrícola de Lavras no ensino e pesquisas com essa cultura é inegável, iniciando com experimentos que geraram resultados relevantes para a época enfatizando, por exemplo, o impacto da adubação. A difusão do conhecimento também foi pioneira pelas publicações realizadas, algumas há mais de 100 anos, que embasaram o ensino e as exposições agropecuárias, exercendo uma função ímpar na difusão de informações.
Referências:
HUNNICUTT, B.H. O milho - sua cultura e approveitamento no Brasil. Rio de Janeiro: Livraria Editora Leite Ribeiro, 1924. 243p.
HUNNICUTT, B.H. Brazil Looks Forward. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1945. 522p.
HUNNICUTT, B.H. Brazil Word Frontier. New York: D. Van Nostrand Company, 1949. 387p.
RIBEIRO, O.J. A importância do milho. O Agricultor, ano 1, n.4, 1922
O Agricultor, n.27 1926
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- Escrito por: Texto: Patrícia Paiva e revisado por Pauline Freire Pimenta.
- Categoria: Memórias
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Quando os americanos chegaram em Lavras para a missão evangélica que deu origem à Escola Agrícola de Lavras (EAL), a cidade ainda estava em formação, com quase nenhuma estrutura. De acordo com relatos encontrados no diário de um deles, a cidade foi assim descrita: “Lavras era uma cidade datada dos dias coloniais e, como seu nome indica, tinha sido cenário de mineração que enriquecia coroa de Portugal. Pode-se dizer que havia apenas uma rua poeirenta ou lamacenta, conforme a estação, e ainda rasgadas pelas rodas dos pesados carros de bois.” (Vanda Mendes, 2024).
Os missionários, normalmente chegavam como casais ou famílias, e as esposas e filhas rotineiramente se envolviam nas atividades da escola fundada (Escola Agrícola de Lavras - EAL, depois Escola Superior de Agricultura de Lavras - ESAL). Elas ministravam disciplinas como Artes Domésticas, História Sagrada, Inglês, Matemática, Educação Física. Algumas auxiliavam nas atividades administrativas da escola, atuando como como secretárias, bibliotecárias, diretoras de internato e externato, encarregadas de refeitório.
O Instituto Evangélico registra, por exemplo, em Prospecto de 1922, os nomes das professoras e conteúdos com os quais trabalhavam: “Charlotte (Carlota) Kemper - História Sagrada e Inglês; Katherine Bockwalter - Artes Domésticas e Educação Física; Miss Charlote Landes – Matemática e inglês; Miss Genevieve Marchant – Inglês. Katharine Bockwalter”, que veio a se tornar esposa do professor e diretor da ESAL John Wheelock, além de atuar como diretora do Internato Colégio Carlota Kemper (a escola de meninas do Instituto Evangélico).


Já em 1922, há o registro das professoras “Guilhermina Alves – Artes domésticas e Ruraes, Mary Hall – Pintura e desenho, Martha Glenn Roberts (esposa do Dr. Roberts) – música ao piano e vocal, Charlotte (Carlota) Kemper - História Sagrada e Hattie Tannehill – Pedagogia”. Em Prospecto de 1927 constam “Hulda Sickert – artes domésticas, Emma Knight (esposa do professor Charles Knight) – inglês e Clara Gammon (esposa de Gammon) – pedagogia”.
Um caderno, legado de Clara Moore Gammon, registra lições de culinária e receitas. Acredita-se que tenha realizado cursos sobre o assunto antes de vir para o Brasil. Nos registros, o ano era 1897.
A participação nas Exposições
Muito ativas, participavam das exposições agropecuárias, ministrando cursos, expondo produtos elaborados pelas alunas do Colégio Kemper, para os quais havia inclusive concursos. São atividades ocorridas nos primórdios do século XX, marcando uma participação feminina que deixou registros na comunidade local.

Pela lista de premiações, observa-se que eram ensinados: bordado a mão, crivo, ponto de marca, tecido no tear, costura à máquina, bordado em máquina, remendos, pintura.

As premiações ocorridas durante os certames das exposições serviam como reconhecimento e estímulo para as senhoras, que se dedicavam a aprimorar nos trabalhos de costura e bordados, conforme é relatado em O Agricultor de 1928.

Além das exposições, em outros eventos, como a Semana de Milho, realizada de 24 a 29 de agosto de 1925, as missionárias tinham também atuação expressiva.
As receitas eram divulgadas e foram publicadas em “O Agricultor”, na secção “O Companheiro do Lar”. Destaque para a receita Pancake de fubá, que ainda utilizava o inglês na sua grafia.
Como resultado destas ações e integração, houve uma permuta de culturas: “a lavrense, construída pelas tradicionais famílias dos bandeirantes e seus descendentes, e a dos americanos, por meio dos seus missionários protestantes”, diz a responsável pelo espaço Pró-Memória, do Instituto Gammon.
Home Economics / Economia Doméstica
Nos Estados Unidos, naquela época, especialmente no Norte, já eram realizados os cursos Home Economics (Economia Doméstica). Os cursos duravam quatro anos, com dois semestres cada um, estabelecidos nos Colleges das universidades americanas. Eram ensinados costura, bordado, cuidados pessoais, etiqueta, culinária, como servir as mesas, cuidados com a casa, contabilidade doméstica, cuidados com bebês e até soroterapia (utilizando animais). Tinham como apoio laboratórios de química, cozinhas experimentais, salas de costura (O Agricultor, dez 1925). Com essa formação, as americanas trouxeram para Lavras a disciplina Artes Domésticas, a qual foi introduzida no sistema de ensino pelo colégio americano que caracteristicamente implantava métodos e sistemas revolucionários de ensino para a época. Essa disciplina adquiriu grande importância e, em 1921, o Instituto Gammon criou o curso de Artes domésticas, no qual eram ministradas matérias tradicionais como português, matemática, inglês e francês, desenho, educação física, história sagrada, música e canto, história, geografia, ciências naturais e matérias muito específicas das artes domésticas, como costura, arte de decoração de casa, enfermagem, puericultura, pronto socorro, arte culinária.
Conforme relato de Vanda Mendes, no 5º ano as alunas aprendiam a bordar e costurar. Havia uma sala especial com muitas máquinas de costura para essas aulas. No 6º ano estudavam Nutrição e Cozinha. As jovens aprendiam a fazer apenas pratos de origem norte-americana, daí terem sido introduzidos no cardápio lavrense. O pão americano (biscuit) por muitos anos foi vendido na extinta Padaria São Jorge, e o doce de chocolate (fudge) ainda é apreciado. As torradas doces e salgadas; o pudim de pão (bread pudding), apelidado pelos estudantes do Gammon de “angu de macaco”; o sorvete; o “ponche protestante”, assim chamado por não ser alcoólico; os pratos frios; as saladas elaboradas; o “candy”, doce batizado com o mesmo nome de origem e atualmente chamado de “bala quente” - essas são todas contribuições desse período de interação com as missionárias americanas.
O curso de culinária tinha como finalidade aprender a “aproveitar os recursos do país e da localidade para tornar mais variada e mais saudável a alimentação”. No último módulo, aprendiam a preparar comidas para crianças e pessoas enfermas (Prospecto IG, 1924).
Além das aulas de culinária, havia também a preocupação em saber receber pessoas. As alunas então aprendiam a técnica de organizar, adornar e servir um banquete, seguindo as regras de etiqueta, e praticavam durante os jantares feitos no Instituto Evangélico, a “escola dos americanos”, como era conhecido na época, segundo Vanda Mendes, que foi aluna de Artes Domésticas, bem como professora e diretora do Instituto Gammon.
Ainda, pelas informações de Vanda, no 7º ano as moças aprendiam decoração de casa com especialistas vindas dos Estados Unidos. As alunas do colégio conheciam as leis que regiam a estética, sabiam onde e como pendurar os quadros, como arranjar as jarras de flores e como dispô-las nos móveis em salas ou quartos. Como resultado dos ensinamentos da escola, as jovens que se tornam senhoras, passaram a manter suas casas com um aspecto agradável, acolhedor, bonito e ajardinado, conta Vanda.
Paralelamente ao curso, tinham aulas de Agricultura e Horticultura, nas quais as alunas acompanhavam todo o ciclo da planta, desde a semeadura, o desenvolvimento até a colheita (Prospecto IG, 1921).
Publicações
A professora Bella Kolb foi responsável pela matéria de Artes Domésticas no Colégio Kemper. Muito atuante, também ministrava cursos e escreveu vários artigos para o periódico O Agricultor. Era filha do reverendo John B. Kolb, pai também de Mary Kolb e de Anne (Nannie) Kolb, segunda esposa de Benjamin Hunnicutt. Após o falecimento de Nannie, Hunnicutt casou-se com Bella Kolb.
No periódico “O Agricultor”, Bella Kolb era responsável pela secção O companheiro do Lar, onde publicava artigos com informações de saúde e família, culinária e estética, relatos de viagem e receitas. Na edição de junho de 1925, o artigo publicado tinha como tema “Como se deve por e servir a mesa”, com informações de como dispor toalhas, guardanapos, louças e talheres. Os modos de servir que poderiam ser à Ingleza, “Rusa” ou Mixta (grafia da época).
Em outubro de 1925, Bella Kolb publicou um artigo intitulado “A alimentação da família”, ressaltando a importância da boa alimentação para os seres humanos, em especial, as crianças. “Não é a quantidade de comida que uma criança come que a nutre bem, mas sim a qualidade da comida”. A autora ressalta as funções e importância dos diferentes grupos de alimentos, da ingestão de água e de respirar ar puro, sobretudo pela manhã e à noite. É um artigo que, apesar de publicado há 100 anos, parece atual.
Receitas
Aos poucos, as americanas foram apresentando receitas típicas. Muitas foram incorporadas no dia-a-dia das lavrenses e acabaram expandindo por todo o País.
O costume de consumir saladas é um desses exemplos. Na época, era comum o consumo de vegetais apenas cozidos. Nas aulas de culinária, as alunas aprenderam como preparar saladas e consumir verduras cruas. Assim como também houve a valorização do consumo de frutas.
O pudim de pão é outro exemplo. Carlota Kemper ficava indignada ao ver como os brasileiros desperdiçaram pães – não sabiam como aproveitá-los. Assim ensinou a preparar o bread pudding/pudim de pão utilizando os pães “amanhecidos” como são chamados. Os alunos do Instituto apelidaram esta iguaria de “angu de macaco”. Outra forma de aproveitar os pães era fazendo torradas e as consumiam com geleias. Ambas as receitas foram ensinadas pelas americanas.
Nas festas era servido o ponche “protestante”, assim denominado por não ser preparado com bebida alcoólica. O ponche é uma bebida elaborada com suco e frutas picadas e espumante na sua versão alcoólica.
O preparo dos ovos mexidos, típicos do café da manhã americano, era ensinado às alunas e sua receita foi publicada na edição de “O Agricultor” de 1927, ilustrando um artigo de autoria de Bella Kolb, relatando a importância dos ovos na alimentação familiar.
A grande sensação das alunas era preparar o “Divinity”, um doce típico do sul dos EUA, feito com açúcar, clara e nozes, servido em eventos especiais.
O “Fudge”, um docinho de chocolate e que permite algumas variações, também era ensinado nas aulas pelas missionárias e muito apreciado pelas alunas. Receita informada pela D. Vandinha, conforme ensinado pelas americanas:
1 copo de leite
2 copos de açúcar
2 colher bem cheia de manteiga
6 colheres de achocolatado ou chocolate em pó (ou 3 colheres de achocolatado e um pedaço de chocolate meio amargo)
Colocar em uma panela alta e levar ao fogo. Deixar ferver (não precisa mexer muito). Quando começar a cheirar o chocolate, tirar uma provinha com a colher e colocar em uma vasilha com água frio. Dando o ponto de “bala média”, desligar, bater um pouco e colocar em uma forma. Quando esfriar, cortar em quadradinhos. Este doce serve como base, podendo ter variações com a adição de amendoim moído, castanhas/nozes trituradas.
O gelo também foi uma novidade para os lavrenses. Conta-se que Carlota encomendou o produto do Rio de Janeiro e o fez chegar até Lavras para apresentar a inovação.Ensinaram também, nas aulas, outras receitas como a preparação de repolho “au gratin”, gelatina, pãozinho americano (biscuit), tortas doces e salgadas, além do sorvete.
O bolo de coco era uma das especialidades de Nannie Hunnicutt. Por muitos anos, era o bolo mais tradicional na família, servido nos aniversários de todos, de reuniões importantes, casamentos. Apenas uma única neta, Jean Hunnicutt Fuser, já falecida, aprendeu e sabia fazer com perfeição. A receita foi publicada na secção “O Companheiro do Lar”, de O Agricultor em 1926.


Bolo de Coco (Nannie Kolb Hunnicut)
1 xícara de manteiga
2 xícaras de açúcar
3 xícaras de farinha de trigo
4 ovos
4 colheres de pó royal (rasas)
1/2 colher de café de sal
1/2 colher de café de baunilha
1 xícara de leite
Preparo:
A farinha deve ser peneirada antes de medir, depois ajunta-se a esta todos os ingredientes secos e peneiram-se estes juntos três vezes. O açúcar, a manteiga e as 4 gemas devem ser bem batidas até que a massa fique lisa e por último a baunilha e finalmente as claras são colocadas na massa sem bater.
O Suspiro
3 claras
3 xícaras de açúcar
1/2 colher de café de caldo de limão
Batem-se as claras até ficarem bem duras; depois ajunta-se às claras 3 xícaras de açúcar e bate-se por uma meia hora. Esta massa deve ficar lisa e o caldo de limão é posto no fim.
O Bolo depois de quase frio é partido no meio fazendo duas partes. A parte inferior do bolo é coberta com a terça parte do suspiro e por cima desta um terço de um coco ralado.
Coloca-se a outra parte do bolo em cima desta parte enfeitada e cobre-se todo o bolo com o resto do suspiro, usando todo o coco.
O efeito é tão belo quanto delicioso o paladar.
Publicação em “O Companheiro de Lar” O Agricultor Julho-1926
Outras imagens
Receitas de Nannie Hunnicutt (compartilhadas por Telita Hunnicutt e outras netas)
Strawberry Short Cake
2 ½ xícara de farinha de trigo
½ xícara de açúcar
6 colheres (chá) fermento
1 pitada de sal
½ xícara de leite
½ xícara de manteiga
- Misturar todos os ingredientes secos
- Juntar a manteiga e esfarelar com os dedos
- Juntar o leite e trabalhar ligeiramente com as mãos
- Forrar um pirex redondo com esta massa e levar ao forno quente
- Depois de assada, rechear com morangos amassados com açúcar
- Reservar uma porção deste recheio e colocar por cima depois Chantilly e morangos para decorar
- Se quiser, antes de rechear e ainda quente, passar um pouco de manteiga na massar e polvilhe com açúcar e canela.
Mineiro com botas
Fritam-se algumas bananas da terra
Cortam-se tirinhas de queijo mineiro
Coloca-se num prato formando um xadrez, uma camada de banana outra de queijo
Polvilhado com açúcar.
Depois seca-se no forno regular por uns 15 minutos.
Sponge Cake
6 gemas
3/4 copo de açúcar
1/4 copo de suco de laranja
1/4 copo de água
1 1/2 copo de farinha
1 colher de chá de fermento
1/2 colher de chá de canela
1/4 colher de chá de noz-moscada
1/4 colher de chá pimenta síria
6 claras em neve
1/4 colher de chá sal
3/4 copo de açúcar
Antigo livro de receitas em PDF
O legado da missão americana na culinária e nas artes em Lavras
- Detalhes
- Escrito por: Patrícia Duarte de Oliveira Paiva, com colaboração de Vanda Amâncio Bezerra Mendes. Revisão: Ana Eliza Alvim
- Categoria: Memórias
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Primórdios da indústria de laticínios
A primeira indústria de laticínios do Brasil foi fundada em Minas Gerais, em 1888, por Carlos Pereira de Sá Fortes, no distrito de Palmyra, hoje cidade de Santos Dumont (MG). Para isso, foi necessário importar equipamentos da Europa, e dois queijeiros holandeses atuaram nos dois anos iniciais da fábrica. O deputado-geral da Assembleia da Corte, Rui Barbosa, atuou em projetos que estipulavam mudanças para a educação brasileira, e indicou que as instituições de ensino superior deveriam oferecer capacitação aos alunos, evitando a dependência de mão-de-obra estrangeira.
Laticínios na EAL

Na Fazenda Modelo da Escola Agrícola de Lavras, com 250 hectares, foi prevista a instalação de uma fábrica de manteiga. As instalações de laticínios tinham como finalidade ensinar aos alunos sobre a indústria agrícola de maior importância na economia do estado de Minas Gerais na época.
Quando falamos de “Agricultura”, empregamos o termo em sentido lato, abrangendo todas as ramificações da vida do fazendeiro. O curso, portanto, que ensina a sciencia e a arte de agricultura deverá abranger não somente o que disser respeito à plantação, cultivo e colheita dos fructos da terra, mas também os princípios que têm de ser observados na criação de todas as espécies de gado e na depuração da raça dellas, e bem assim o essencia da industria de laticinios [...] (Samuel Rhea Gammon, 1908).
Esta estrutura estava sempre à disposição dos professores e estudantes para trabalhos práticos das suas disciplinas (ou cadeiras, como eram denominadas na época). As instalações foram concluídas em 1936.
Prédio de Laticínios e equipamentos

Em 1928 foi anunciada a construção de um novo prédio para abrigar as atividades do laboratório de laticínios. Nessa estrutura, concluída em 1929, passaram a ser ministradas as aulas práticas de laticínios, que ocorriam desde 1909 em estrutura na Fazenda Modelo Ceres. Esse novo prédio foi construído antes do prédio Odilon Braga (1937), que integrava o conjunto dos quatro prédios principais da escola, o que destaca a importância dessas disciplinas e das aulas práticas na formação dos alunos.
O novo prédio era equipado com maquinário e aparelhos utilizados para a fabricação de manteiga e queijo, bem como uma sala para as análises de leite e seus produtos, além de outros trabalhos de laboratórios. Estas instalações contam com aparelhos para análise de leite e seus produtos, com aparelhos de Babcock Gerber para determinação de matérias gordas, acidimetria, aparelhos para determinação de sal, de impurezas, entre outros.
Também foi equipado com uma máquina de gelo, que era inovação para a época, fabricada pela companhia dinamarquesa Atlas, de Copenhague. A descrição de funcionamento desta máquina foi publicada no jornal Tribuna do Povo em 1928.,
“Exige para seu perfeito funcionamento uma força motriz de 3 HP, podendo ser a vapor, a água ou a electricidade. Quando a machina está funccionando, produz-se o vacuo na parte chamada “refrigerador”, o vacuo causa uma evaporação rápida do refrigerante, que é, nesta machina o bi oxydo de enxofre (SO2); o calor exigido para esta evaporação é retirado pelo refrigerador do ambiente com que se acha em contacto e, portanto, este fica esfriado. Este esfriamento é captado pela “Câmara frigorífica”, que se acha circundado por salmoura, cuja densideade é de 22° Baumé.
O gaz refrigerante vae do refrigerador para o condensador, aqui sofrendo uma compressão, causa o desprendimento de calor, devido a isto é que, esta machina, exige uma quantidade de 300 litros de água por hora para poder esfriar as paredes externas do condensador e, portanto, o interior juntamente com o gaz. Este typo de machina produz em 24 horas, trabalhando sem interrupção, de 336 a 380 Kgs de gelo, além da refrigeração que faz.”


Nesta fábrica havia motores elétricos que movimentavam as máquinas, a caldeira a vapor movimentava o motor de emergência e fornecia vapor para a esterilização dos aparelhos. Contava também com a desnatadeira, batedeira, salgadeira (combinação), espremedeira, cravadeira, máquina frigorífica “Glacia”, entre outras.
Na estrutura do Laticínio existia um departamento para fabricação de manteiga de fina qualidade, produzindo mensalmente mais de 2 mil quilos de manteiga marca “Agricola Nova”, comercializada principalmente no Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte. Alguns dos equipamentos para a instalação da fábrica de manteiga e pasteurização do leite, que era distribuído na cidade em vasilhames esterilizados, já haviam sido adquiridos em 1909, em uma ação inovadora de Benjamin Hunnicutt.

Benjamin Hunncutt observou que naquela época ainda havia manteiga importada da França sendo comercializada e poucas fábricas existiam no Brasil. A manteiga produzida apresentava excelente qualidade e tem-se o registro de pelo menos duas premiações recebidas:
- Medalha de ouro na 2ª Exposição de Leite e Derivados, realizada no Rio de Janeiro em 1929.
- Medalha de Ouro na Exposição comemorativa do Cinquentenário da Estrada de Ferro Sul de Minas a Cruzeiro, em 1934.

Nos primórdios da instituição era comum a participação em exposições agropecuárias e também exposições especializadas em laticínios, difundindo, assim, não somente animais e equipamentos, mas também os produtos.
Outro departamento era também destinado à fabricação de queijos, produzindo queijos diversos de forma experimental e para consumo no Instituto Evangélico.
Dentre os registros encontrados, identificou-se que trabalhavam neste laticínio o Sr. José Firmino de Souza, o Sr. Nenê, encarregado da Fábrica de Manteiga Agrícola Nova e o Sr. Antonio Mendes de Carvalho, auxiliar técnico de Laticínio na Escola Agrícola de Lavras, responsável pelas análises laboratoriais e autor de alguns artigos publicados em “O Agricultor”.

Gado
O leite utilizado no Laticínio era proveniente de rebanhos melhorados a partir de duas raças: Holandesa e Schmytz. A escola possuía reprodutores puros, importados dos Estados Unidos e da Europa. Realizava-se também ensilagem, especialmente para alimentação no período de seca.
Há registro de que o gado Schmytz proporcionava excelentes resultados, sendo hibridizado com caracu e zebu e destinado a “gado de campo”, excelentes animais de trabalho ou bois de carro. Já as novilhas Schwytz-hollandezas eram ótimas leiteiras. O estábulo ficava localizado em frente ao prédio de Laticínios.



Ensino de Laticínios
O Decreto de Lei nº 8.319 de 1910, 1º regulamento oficial relacionado ao ensino agrícola, previa o ensino de Zootecnia, com a criação de um Posto Zootécnico e constava a menção a “Escolas de laticínios”. Essas escolas deveriam prever o estudo tecnológico do leite, fabricação de queijo e manteiga e utilização de subprodutos da fabricação; processos de conservação e transporte dos produtos e fornecimento de dados para cooperativas de laticínios (Brasil, 1910).
À frente do tempo, a Escola Agrícola já tinha criado um Posto Zootécnico em 1909. No Programa de Curso apresentado em 1908 já estava prevista a ministração da disciplina Laticínios no último ano do curso Agrícola. E isso ocorreu durante todo o período da Escola Agrícola, assim como ainda hoje é ministrada para os alunos do curso de graduação em Zootecnia com a denominação de “Tecnologia de Leite e Produtos Lácteos”, sob a responsabilidade do Departamento de Ciência dos Alimentos.
A disciplina de Laticínios previa os tópicos de estudos a) Raça leiteira; b) O leite, sua produção e composição, análise comercial; c) Métodos de classificação e exportação. Os alunos tinham como atividade da disciplina Laticínios fazer a preparação da manteiga, auxiliar na fabricação de queijo, enfatizando o caráter prático da formação dos alunos da EAL
O primeiro professor da disciplina foi o Dr. Benjamin Hunnicutt. Na ausência de outro professor, ele assumiu esta cadeira, até o retorno do professor Oswaldo Tertuliano Emerich, da área de Zootecnia e Agronomia, da sua especialização nos Estados Unidos, em 1911. Ex-aluno da escola da primeira turma, foi também o primeiro a ser beneficiado com bolsa no exterior e veio a se tornar importante professor nos primórdios do ensino de Laticínios na EAL e no Brasil. Autor de vários artigos neste tema, publicados em “O Agricultor” e também de livros na área de Zootecnia, como “Suinocultura”. Após a sua saída em 1934, a disciplina deixou de ser ofertada por dois anos, até a contratação do médico veterinário José Assiz Ribeiro, aprovado em concurso público para a 18º cadeira da ESAL, área laticínios, em 1937. O professor teve grande atuação na área de laticínios, sendo pioneiro em pesquisas tecnológicas da produção de queijos no Brasil e autor de várias publicações importantes nesta temática com o artigo “Queijo Minas Artesanal do Serro” e livros “Como fabricar queijos” (1951) e “Fabricação de Queijos” (1961).
Propagandas
A divulgação por parte das empresas era uma iniciativa importante, assim vários anúncios de equipamentos e acessórios para laticínios foram publicados em O Agricultor, como patrocínio para manutenção da revista.
Outras imagens:




Referências
BEZERRA, A.A. Instituto Gammon: dedicado à glória de Deus e ao progresso humano. Rio de Janeiro: H.P. Comunicação Editora, 2016.
BRASIL. Decreto de Lei nº8319 de 20 de outubro de 1910. Crêa o ensino agronomico e aprova o respectivo regulamento. Secretaria de Informação legislativa Senado Federal. Disponível em:
Este é o Caminho. Prospecto
Fazenda Modelo da Escola Agrícola de Lavras. Prospecto
GAMMON, S.R. Prospecto do Instituto Evangélico. Lavras: Typografia do Ginásio de Lavras, 1908.
HUNNICUTT, B.H. Duas décadas de desenvolvimento agrícola no Brasil. O Agricultor, n.1, jan 1927. p.9-10, 23, 29-31.
MANTEIGA. Tribuna do Povo. Lavras MG, Anno VII, n.346, 13 de maio de 1928.
Prospecto das Escolas do Instituto Evangélico, Lavras-MG: Typografia do Instituto Evangélico, 1925. 62p.
Prospecto das Escolas do Instituto Gammon, Lavras-MG: Imprensa Gammon, 1930 51p.
Prospecto das Escolas do Instituto Gammon, Lavras-MG: Imprensa Gammon, 1931 41p.
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- Escrito por: Texto Patrícia Paiva. Revisado por Ana Eliza Alvim
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(atual prédio ocupado pela Corregedoria da Polícia Civil de Minas Gerais)
- Detalhes
- Escrito por: Patrícia Duarte de Oliveira Paiva. Revisão: Ana Eliza Alvim
- Categoria: Memórias
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